Aventuras e desventuras de moças em permanente movimento migratório.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Faz boa viagem!

Há não muito tempo era coisa simpática de se ouvir. Hoje, só de pensar que vou viajar até se m’arrepiam as sobrancelhas. Dantes pelava-me para entrar num avião, hoje dou por mim a respirar de alívio quando o avião se atrasa ou a viagem é adiada por esta ou por aquela razão. Nos últimos 2 anos perdi 3 aviões e tenho para mim que o inconsciente falou mais alto em todas as situações. É oficial: tornei-me uma medrosa, uma gelatinosa, uma assustadiça, uma merdas.
Há 3 dias foi um avião que se despenhou na Indonésia, ontem e hoje foram as explosões no centro de Bangkok. E eu em contagem decrescente para uma viagem intercontinental que me deixa os nervos em franja e os dentes a ranger.
Mas como é que esta merda me foi acontecer? Deixar-me levar por histerias colectivas e ignorâncias proliferantes? Como? É que isto nem sequer é coisa que fique bem com o meu tom de pele!

Eh pá, tenho saudades das viagens que fiz sem olhar para trás, daquelas em que só de ver o avião na sala de embarque até dava um friozinho na barriga de excitamento. Hoje já nem as milhas colecciono. Eu quero lá saber dessa trampa...eu quero é que o bicho aterre no destino!
Mas não é apenas a deslocação que me deixa ansiosa, mas também os destinos finais. Mata-se e morre-se como se nada fosse, assim à queima-roupa, enquanto se está a comprar uma garrafa de água para a criança ou enquanto se está a apanhar banhos de sol. WHAAAAT DAAA FUCKING FUCK!?
Nada se compara à primeira vez em que vi a Torre Eiffel; ou percorri Tiananmen a caminho da Cidade Proibida; ou vi as gazelas correrem ao lado do jipe no Deserto do Gobi; ou sentir-me molhada até aos ossos debaixo das chuvadas tropicais da selva santomense; ou beber uma bela cerveja com a mantinha nos ombros em plena Nyhavn; ou ver o Tejo a iniciar a sua viajem pelos jardins de Aranjuez; ou andar pelas barcas do bairro de lata de Jakarta; ou aquela alfaiataria de saaris nos subúrbios de Nova Delhi onde Valentino era habitué; ou a jukebox do Mondebar a tocar AC/DC; ou percorrer as estradas da floresta negra num C55 AMG. Nada é comparável às sopas vietnamitas, ao café turco, ao chá nas medinas marroquinas, ao hotdog novaiorquino e à enorme infelicidade de nunca ter comido bem em Veneza, apesar de todas as recomendações e dicas.

Tenho saudades de todos os destinos por onde andei e todas as coisas que fiz, sem pensar que um atrasado mental de mochila e t-shirt xpto amarela torrada de perfil identificado por uma camera de filmar de uma caixa multibanco, a abrir os telejornais de todo o mundo, ande por aí à solta a jogar ao “bora rebentar aqui com uns turistas em nome de whatever da fuck” só porque lhe deu forte na P*** da veneta.
É assustador pensar que alguns destinos em que estive dificilmente irei voltar, outros em que jamais levarei a minha filha e outros ainda que simplesmente não posso ir. Tudo isto porque os tempos são o que são e porque o medo lá vai conquistando terreno ao bom senso.

Não sou apologista do quanto mais vejo de mau a acontecer, mais valor dou à minha casinha, por uma razão apenas: isso é estúpido. Mas admito que deixar-me invadir por uma “crise de enervadura” com uma simples deslocação aérea de 40 minutos também não é brilhante.
Há experiências demasiado valiosas para serem ignoradas. Há sítios que temos de ver. Há ruas em que temos de caminhar e caras com as quais nos temos de cruzar. Temos e devemos querer conhecer o outro, o próximo, o que nos é estranho e estrangeiro, porque se não o fizermos, porque se negarmos conhecimento, estamos a negar a nossa própria existência, a nossa humanidade. A vida.
É por isso que eu vou entrar naquele avião e depois daquele mais outro e mais outro ainda e vou chegar lá longe como ó caraças mais velho. Vou ansiosa, mas vou, porque o caos é fruto da ignorância, não do conhecimento. E também porque se eu pedir o dinheiro de volta da viagem, os senhores da agência são capazes de me mandar à merda.

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