Aventuras e desventuras de moças em permanente movimento migratório.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Sapatos e cenas

Quando aqui cheguei, fez ontem 14 anos, vinha cheia de vontade de fazer coisas mas, ao mesmo tempo, amedrontada como o raio.
Isto de começar de novo num sítio diferente em que não se conhece ninguém é uma ganda gaita.
A meu favor tinha o facto de ser descarada e bem disposta. Gostei sempre de levar isto da vida com um sorriso e sem fazer dela um drama kafkiano.
A verdade é que dei por mim a viver numa cidade em que tudo é cosy. Tudo é pertinho. E tudo é cheio de ruas empedradas. O que se revelou ser o maior tormento da vida de qualquer mulher. Que queira disfarçar a sua largura compensando na altura. Ou que queira fazer um bocadinho mais de tóilete…
E foi assim que um dia dei por mim a ter que ir a uma reunião. E sem boleia para voltar para casa. Casa essa que eu ainda não sabia bem onde era. Todas as minhas boleias debandaram e disseram-me para apanhar um táxi.
Eu tentei. Mas ninguém teve o descorro de me avisar que isto não é Lisboa E que os táxis não andam por aí. Temos de ligar para a central e pedir um.
E eis que me vi, sozinha, sem saber como ir e para onde ir.
Meti pés ao caminho e aventurei-me. De sandálias de salto alto e fino. Em Julho. 50 graus. E fiquei com a sandália presa na primeira pedra. Mas, como sou forte como o raio, não me desmontei e segui. Confiante e de peito feito.
Encalhei a segunda vez e quase que perdi a pose. Mas respirei fundo e continuei. Obstinada. Tropecei a terceira vez e andei três metros antes de perceber que tinha deixado a sandália lá atrás.
Desisti. Tirei as sandálias, ajeitei-as na mão qual Chanel que causa fúrias e vómitos a toda a gente, e lá fui. Descalça e furiosa. Sem saber para onde.
Quando resolvi parar e perguntar a umas senhoras que estavam à porta onde era a minha casa, recebo como resposta: “A menina não é de cá, pois não? Vê-se logo pelos sapatos!”
Moral da história: que se lixem as pedras da calçada. Desde que haja alguém para me amparar, não há nada que me tire do salto!
Claro que para ter mais piada, o texto seguiria assim a partir do quinto parágrafo:
Sai do primeiro da andar naquela rua íngreme e à porta sentada numa cadeira de palha a Dona Mimi que fazia renda para fora deu me a indicação que faltava, não sabia o que era um táxi!. O senhor António seu falecido marido ex funcionário dos TLP nunca teve carro, apenas no momento de maior desafogo tiveram uma pileca mas que teve de vender quando se reformou. Sai para a rua principal e procurava esses veículos pretos e verdes com uma luzinha a piscar e nada.
Mas não era a mesma coisa. Mas podia ser em Évora.




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